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Praia da Concha - Itacaré BA
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Itacaré é uma cidade feia com praias lindas. Pequena, suja e
com o maior número de desocupados por metro quadrado que já tive oportunidade
de ver. São, em sua maioria, homens jovens, fortes, saudáveis. A população é em
sua maioria masculina.
No dia seguinte a nossa chegada, pela manhã, resolvemos
caminhar por toda a extensão da praia da Concha antes de escolhermos em qual dos
quiosques ficaríamos. São várias opções dos mais variados tipos. Os
barraqueiros vêm nos abordar ao longo do caminho como se fossemos a salvação da
sua lavoura. Chega a ser constrangedor.
Optamos por uma barraca super bonitinha, ultra limpa e com atendentes
simpáticos. Robson foi o nosso garçom amigo durante os dias que lá passamos.
Devidamente instalados, pés na areia, visão espetacular de
um mar hora verde esmeralda, hora azul, começou o desfile.
Desfile de pessoas vendendo bijuterias, cangas, pinturas,
doces, castanhas, oferecendo sua arte, oferendo tatuagens de rena, oferecendo
massagem. É massagem! A pobre moça, magra, visivelmente viciada em crack,
oferecia para massagear nossos pés em troca de algum dinheiro. Uma judiação.
Hippies aos quilos vendendo mais do mesmo. Arames e cordas
traçados em formatos pouco criativos. No meio deles um oásis: Nicholas. Um
argentino que se apaixonou por uma gaúcha.
Juntos resolveram viver na Bahia. Todos os dias, batíamos um papo em
portunhol, hora na praia, hora na cidade, na banquinha dele. Uma das doces
lembranças de pessoas que lá conhecemos. O Robson, garçom amigo é outra.
No meio disso tudo meninos. Vários, quase iguais. Todos
oferecendo a “sua arte”. E o que eles chamam de arte, sem querer menosprezar,
nada mais é do que um peixe ou uma flor trançada em vegetação. Como aquele cara
do semáforo que faz gafanhotos.
No primeiro dia ele chegou e junto dele outro, mais risonho.
Encostou do meu lado e falou baixo, bem baixo:
- Dona, posso te mostrar minha arte?
- Pode. O que você faz?
-Faço peixe com essa planta aqui.
-E quanto custa?
-Quanto a senhora quiser pagar.
Depois de alguns minutos trançando me entregou um peixe
bonitinho. O “quanto a senhora quiser
dar” é uma grande mentira, porque ficou absolutamente irritado com os R$ 5,00
que dei.
Enquanto trabalhava perguntei o nome dele: Enilson, ele
disse.
Meu marido disse que ele parecia o Felipe – goleiro do
Flamengo. E não é que parecia mesmo?!
Ele fechou ainda mais a cara. E disse num tom bem próximo ao
grosseiro:
- Que Felipe que nada!
Entendemos aquilo como um “não torcedor do flamengo” meio
bravo com a comparação.
No dia seguinte, mesma barraca, mesma mesa passou Enilson:
- Oi Dona, posso mostrar minha arte?
- Você me mostrou ontem. Comprei um peixe;
Ele em tom muito desconfiado:
- Onde?
- Aqui mesmo, sei até o seu nome.
E ele em tom desafiador:
- Sabe nada... como é então?
- Enilson
Saiu sem dizer palavra, pisando duro.
Dois dias depois, mesma barraca, mesma mesa, passa Enilson:
- Posso mostrar minha arte?
- Já conheço Enilson, comprei um peixe, lembra?
Meu marido:
- É chamei você de Felipe.
Saiu pisando duro de novo resmungando:
- Que Felipe que nada !!!
Mais dois dias, mesma barraca, mesma mesa, passa Enilson:
- Dona, posso mostrar minha arte?
- Ahhhh moleque, você tá de gozação comigo, né?
Saiu rindo, com um ar irônico.
Como ele outros apareceram. Nem tão dissimulados, mas com
olhar igualmente triste, com a mesma raiva na voz e conversas muito agressivas.
- Não gosto dele – disse Maurício sobre Enilson – Se mexer
comigo vai levar facada.
Durante a semana que passamos lá desenvolvemos algumas
teorias pra essa realidade, mas uma me fez pensar:
A cidade cresceu e trouxe o turismo. Com ele pessoas
diferentes com poder aquisitivo muito maior que o deles. Esse contato despertou
a cobiça e a falta de possibilidades a inveja. A inveja gera agressividade.
Itacaré é uma cidade feia, com gente desocupada, mas de
beleza natural impressionante. Mesmo diante disso tudo valeu a pena conhecer.
Jorge Amado, se vivo estivesse, em visita à cidade não mais
escreveria Os Capitães da Areia, os meninos de Itacaré são no máximo Sargentos
da Areia. E olhe lá!!!!