Quando soube que Donna Summer
tinha morrido, senti saudade antes de sentir tristeza. Saudade de um oásis em
meio ao caos que foi minha adolescência.
Era Janeiro de 79 e eu estava
de férias em Pontal, hospedada na casa
da minha querida tia Neide. Vó Carolina ainda era viva e impunha, mesmo sem
querer, sua presença. Sempre muito quieta, mas igualmente forte, passava a
maior parte do tempo na sala de jantar onde ficava a vitrola. É, vitrola!
Ao lado dela - da vitrola,
claro - durante todo o tempo em que lá estive, repousava a capa do LP duplo, Live And More, lançado pela Donna no ano
anterior. Era ao som de Mac Arthur Park
que eu acordava todos os dias.
Lembro-me de abrir os olhos nos
primeiros acordes e sentir uma alegria imensa. Estava na cidade que eu tanto
amava, cercada de pessoas que me tratavam com tanto carinho.
Não demorava pra minha tia
entrar no quarto, avisando que o café estava servido. Sempre carinhosa,
sentava-se a beira de uma das camas e queria saber o que tínhamos feito na
noite anterior.
Meu dia começava bem. Muito bem
para a uma menina, adolescente, que estava vivendo a felicidade inexplicável da
conquista do primeiro amor. E o primeiro amor morava na casa da frente!
Pulava da cama, abria um pedacinho
da janela e espiava. Como era fácil ser feliz: Uma janela entreaberta e uma
possibilidade.
Não me lembro de ter vivido
emoção assim. Não me lembro de ter amado com tanta ingenuidade, com tanta
entrega, sem expectativa.
Nessa época o namorar era feito
de beijos, abraços e mãos entrelaçadas. Não havia possibilidade de qualquer
avanço. A delicadeza da lembrança talvez se deva exatamente a isso.
No meio do mês, como todos os
anos, fomos para o Guarujá. Minha prima Rosana, eu, meus pais e irmãos. Foram
15 dolorosos dias, na praia, longe dele, da Donna e do Mac Arthur. Dias em que
incansavelmente negociava com meu pai a volta à Pontal para passar os últimos
dias de férias.
Sinto ainda forte emoção quando
me lembro do dia que voltei. Era noite, o céu estrelado de forma inacreditável,
Tio Luiz na calçada com o braço em volta da tia Neide.
Meu olhar vagava entre o céu e
a porta da casa do meu amor. De repente ela – a porta - se abriu e rapidamente,
numa brincadeira, me esconderam. Posso vê-lo atravessando a rua, num passo
desengonçado de menino que cresceu demais.
Que delícia lembrar a cara que
ele fez quando me viu! O sorriso, que era lindo, se abriu e o olhar, que sempre
foi penetrante, sorriu junto.
O desejado beijo não pode ser dado.
Não naquele momento.
- Nãoo, não na frente dos tios!
Ah, como era bom estar
apaixonada e ter esse amor correspondido, como é bom poder lembrar isso com
tanto carinho.
Vivemos uma história linda,
naqueles dias quentes de verão e céu exuberante. Simples, sem planos abstratos e
com todos os sonhos concretos.
A vida não nos quis juntos. O
amor não foi suficiente, ou talvez, simplesmente tivessem outros planos pra
nós.
Cada um seguiu a sua maneira.
Fiz minha família, ele a dele.
Fiz carreira, ele desistiu.
Sou feliz, mas não posso afirmar o mesmo sobre ele.
Nunca mais nos falamos. Nunca mais!
Nunca mais nos vimos. Só a distância, há 5 anos!
Mas a verdade, é que isso não
tem a menor importância. O que conta é a emoção que pude viver graças ao que
vivemos. Emoção que ainda posso sentir quando e onde quiser.
Quando Donna morreu, uma parte
dessa história se foi, mas pra minha sorte não levou nada com ela. Só deixou:
Uma música, uma lembrança e uma
saudade.
É Chrislaine, Donna Summer marcou mesmo!
ResponderExcluirVc falou uma coisa bem certa. Antes da tristeza pela morte da Donna Summer, senti saudades. Saudades da música dela que marcou um tempo revolucionário para mim. Saindo debaixo das asas de pai e mãe, ganhando o mundo, descobrindo o prazer da liberdade, de andar sozinho, de assumir as próprias responsabilidades perante a vida, o mundo. O prazer de caminhar pelas próprias pernas, de perceber um mundo de possibilidades.... Donna Summer fez a trilha sonora de boa parte de minha adolescência... como não ter saudades???
ExcluirBjs, Ferraz
A propósito, belo texto mais uma vez... rsrsrs
Nem vou falar do Sennor Winter!
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