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Blog de histórias reais e de ficção.
Um lugar para expor opiniões que provoquem dor ou delícia!
Qualquer semelhança com histórias ou comportamentos reais poderá ter sido mera coincidência. Ou não!



sexta-feira, 29 de outubro de 2010

É com B ou com M ???





Outubro de 2001, Vânia e eu desembarcávamos no Zumbi dos Palmares em Maceió para uma semana de férias com nossos amigos Daniel Basso e Ferraz Júnior.
Foram dias deliciosos  de praia, passeios em lugares divinos e claro, muita risada. Aliás,  nós quatro juntos produzimos essa magia do riso fácil, solto, literalmente feliz.

Uma manhã resolvemos ir até Penedo. De lá sai um Catamarã para o Delta do São Francisco. Passeio obrigatório! Andamos 150 quilômetro e quando chegamos soubemos que a embarcação já tinha saído. Frustração geral. O que fazer? Voltar estava fora de cogitação.
Conversa daqui, conversa dali descobrimos um senhor que alugava barcos pequenos com guia. Nem pensamos duas vezes, compramos comida, isopor com cerveja gelada, muito protetor solar e  embarcamos com nosso guia a tira colo.

O passeio é lindo, o Rio São Francisco é uma energia. Vibra, muda de cor, de textura. Fica tranqüilo se agita. Ele é o senhor que tudo pode.

As margens do Rio, casebres com pessoas acenando, como se nossa passagem por ali  fosse o único elo com um mundo que eles pouco conhecem.

Nosso guia, um garoto de aproximadamente 14 anos, muito tímido, sentado no fundo da embarcação contava o pouco que sabia com aquele sotaque delicioso.

Na hora de comer convidamos nosso novo amigo a sentar-se  conosco mas ele educadamente recusou alegando ter levado seu próprio lanche. Entendemos afinal, ele já tinha se mostrado tímido.
Pouco depois olhamos e lá estava ele, comendo bolacha recheada com garfo e faca. Foi difícil conter o riso diante de cena tão ingênua. Ele, um garoto simples, queria nos mostrar que era bem educado.

Conversamos muito, fizemos várias perguntas. Num determinado momento passamos a perguntar sobre ele. O Rio fala por si, queríamos saber como um menino de 14 anos vivia naquele mundo de pobreza e ainda mantinha tamanha alegria.

- Qual o seu nome ?
- Bororó
- Bororó ou Mororó ??  Não conseguíamos entender o que ele dizia.
- Mororó !!!!
- Mas é com B ou com M???
- É com Ó !!!! BororÓÓÓÓ !!

Risada geral !!! Nem o condutor, acostumado com ele se conteve.
Nos olhamos com misto de dúvida e constrangimento e saímos de lá sem saber o nome do rapaz.


                                                   Na foto, eu, B/MororÓOOOO e Vânia. 

quinta-feira, 14 de outubro de 2010

QUANDO EU ERA CRIANÇA PEQUENA LÁ NA BARBACENA...


... A Usina produzia a plenos vapores e o cheiro do “garapão” tomava conta de toda a fazenda.

Na cozinha, enquanto minha avó, que tinha dedos incrivelmente longos, batia a nata do leite pra fazer manteiga caseira,  Cunga, a ajudante, fazia frangos caipiras deliciosos no fogão de lenha.

Um pomar com manga, tangerina, limão, seriguela e parreira com uvas verdes, sempre azedas. Horta, que tinha um pouco de tudo, algumas galinhas chocando, outras botando em cima de poleiros sujos e porcos. Ou seria porco?

A casa era pequena, mas imensa na minha lembrança. Três quartos, com portas duplas azuis, muito altas, um banheiro com banheira e uma janela tão grande que nem sei pra que porta !

O piso de vermelhão sempre impecável de brilhante. Dois alpendres*, um que dava pra rua, com direito a rede e mesinha que usávamos para os jogos de buraco dos finais de tarde e outro na passagem para o quintal. Neste tinha uma pia com uma torneira que dava choque e eu era vítima. Dava choque mesmo, mas meu tio - único solteiro na época - me achava a fresquinha da capital e não acreditava. Um dia, ele mesmo experimentou. Lembro da minha maldosa satisfação!

Sala de estar, com um móvel lindo, antigo para a televisão preto e branco, duas poltronas de courvin, uma marrom, do meu avô e outra preta da D. Conceição, minha avó. O sofá era vermelho encostado na parede abaixo da janela.

Sala de jantar com mesa de fórmica azul clara e oito cadeiras forradas com estampas de gosto duvidoso. Duas delas ainda existem e estão na minha casa.

Meu avô tinha um fusca azul calcinha – que combinava com a mesa de fórmica -  e parava o carro na rua apesar da garagem enorme que tinha ao lado da casa. Não só parava do lado de fora, como deixava aberto e com a chave dentro. Eu achava aquilo o máximo da tranquilidade.

Na frente da casa um gramado onde eu e minhas Suzys inventávamos histórias de reis e rainhas perseguidos por cachorros gigantes – papéis desempenhados bravamente pela Puppy e a Quirei – as “Pequinês” da família.
A Usina era uma verdadeira cidade com clube, cinema, posto de saúde, armazém de secos e molhados (me lembro a confusão que fiz quando surgiu a banda do Ney), farmácia, igreja, água tratada, campo de futebol, escola e muitas colônias. Algumas próximas à indústria outras bem distantes. O que definia quem morava onde era a atividade de cada um. Os homens que atuavam dentro da usina, no escritório, clube, farmácia, cinema e escola moravam no “centro”. Os que trabalhavam no plantio e colheita moravam nas colônias mais afastadas.

Foi na Barbacena que descobri que Cacilda era nome de gente! Oh Meu Deus, isso merece uma explicação: Nossos vizinhos em São Paulo tinham uma cachorra chamada Cacilda e eu mudei pra lá com apenas um ano. Aos 9, quando me apresentaram a Cacilda, irmã da Magali corri pra casa, chamei minha mãe num canto e disse:

- Mãe, coitada ! A moça tem nome de cachorro.

Era lá que ouvia nas noites de sexta e sábado a música do filme A Ponte do Rio Kwai chamando para a sessão de cinema que ia começar. Quando tocava,  sabíamos ter 10 minutos pra chegar e ocupar nossos lugares num camarote improvisado. Eram dois, na verdade e ficavam no andar de cima, com 8 poltronas azuis marinho, separados pela sala de projeção. Privilégio do gerente da Usina, cargo do meu avô. Lá assisti filmes antigos dos quais nem me lembro mais. Sei que eram velhos, de produção e de conservação. Virava e mexia o filme “partia”, as luzes se acendiam e o povo vaiava.

Lá fiz amigos que me lembro com carinho: A Eva, a Nenice, o Cirço. Seu Pernambuco, que cuidava da bomba, a Dona Lila - melhor amiga da minha avó - que tinha um dos olhares mais doces da minha infância e fazia comida bem boa.

A Barbacena era minha alegria, era o meu porto seguro.

Hoje virou distrito de Pontal com  nome bem esquisito – Walter Becker –  a usina foi desativada e pior: grande parte das casas da minha feliz infância foram demolidas.

Onde antes funcionava o cinema: ruínas e no lugar das poltronas, muito mato. A estátua de Santo Antônio na praça ainda está lá - deve ser milagre do santo.


Quando eu era criança pequena lá na Barbacena, andava descalça, subia em árvore, tomava água do riacho, fugia da mula sem cabeça imaginária, viva encardida de terra e respingo das canas de chupava direto do pé. Andava livre pelas colônias puxando conversa com quem passava, brincava com barro na olaria, sonhava em nadar no açude - era proibido! Corria dos cachorros soltos, ria sem reservas, ficava de castigo pelas artes e era uma felicidade só!
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