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Blog de histórias reais e de ficção.
Um lugar para expor opiniões que provoquem dor ou delícia!
Qualquer semelhança com histórias ou comportamentos reais poderá ter sido mera coincidência. Ou não!



sábado, 29 de setembro de 2018

Aquele 1º de Janeiro.




Naquele primeiro de Janeiro, ele acordou cedo. Antes de se levantar, chamou a mulher.

- Levanta, Adélia. Faz o café e arruma os meninos. 

Sentado “no trono”, pensava com satisfação na vitória daquele que seria o salvador da pátria.

- Agora sim, o Brasil vai pra frente. Ordem e Progresso. Acabamos com esses comunistas. Acabamos que esse Lula. Nunca mais vamos ver aquela Dilma. Estamos salvos!

Na cozinha, Adélia fazia o café enquanto as crianças corriam ao seu redor, gritando animadas.

- Mãeeeeeee, a gente pode ligar a televisão????
- Pode, filho! Gersonnn, anda logo!!! Vai começar.

Já na sala, todos acomodados no sofá. Hino Nacional, mão no peito, lágrimas escorrendo pelo rosto, ele pensava naquela pistola Taurus TH 380 full size que tinha visto na internet.

- Amanhã mesmo eu compro. Minha família vai ficar segura. Passou do portão e eu não conheço? Tiro!!! Encheu meu saco no trânsito?? Tiro!!!

Adélia, no canto do sofá, olhava com alívio para aquele homem, normalmente tão mal humorado e agressivo.

- Hoje vai ser um bom dia. Ele vai melhorar! Ele vai melhorar!!!  E com esperança sorriu.

Na TV, um general e um capitão. Ternos impecáveis, gestos militares, mulheres ao lado, compondo o cenário. Uma multidão gritando com a empolgação  dos fanáticos.

- Mitoooooo!!!!! Mitoooooo!!!!!

O Capitão então faz um gesto para que se calem e diz olhando para a câmera:

- Você que não votou em mim, é bom já ir se acostumando, porque as coisas vão mudar, Ok? Decreto que a partir de agora  o congresso está fechado. Não serve pra nada!!! Prá nada!!!!

- Não existe mais casamento gay. Vamô pará com essa viadagem. O filho começa a ficar assim meio gayzinho, leva um coro ele muda o comportamento dele. Tá certo???

- Vamos acabar com esse papinho furado de facilitar a vida dessas minorias. Nada de cotas. Preto tem os mesmos direitos dos brancos. Eles não querem igualdade, então? Nada de cotas, ok??

-  A partir de hoje, mulheres não votam mais. É um corretivo pra aprenderem a se comportar.

Adélia olha pra Gerson com olhos de pavor e ele retruca:

- É bem feito pra essas vagabundas que foram pra rua com aquele papinho de #ele não!! Agora vão ter o que merece.
- Mas eu não fui, marido. Eu votei nele.
- Não interessa. Mulher é tudo igual. Tô loco pra chegar amanhã no escritório e mandar  meia dúzia embora.

Na TV, o discurso continua.

- E quem desobedecer minhas regras vai sofrer com isso, OK??  Não vou cometer o mesmo erro de 64. Agora vou torturar  e matar !!!!

A plateia delirava.

- Mitooooo!!! Mitoooooo!!!!!!

Gerson levanta, vai ao lado da TV, faz pose e manda Adélia fotografar. Quer postar no Facebook. Quer esfregar na cara dos amigos esquerdopatas que não votaram no mito. Quer mostrar pra todo mundo quem é que manda agora.  Sente-se legitimado!! Não precisa mais esconder seus preconceitos e sua intolerância. Agora sua vida será perfeita.

Pega o celular, acessa a internet, entra no aplicativo e se depara com a mensagem:

- Rede Social banida em todo território Nacional.

Tenta outra e outra e mais uma e em todas, a mensagem é a mesma. 
Entra nos sites de notícia, um após o outro. Todos com a mesma mensagem:

- Proibido o acesso em todo território Nacional.

Muda o canal da TV. Em todas as emissoras a mesma imagem do mito, gesto de arma com as mãos, o grito da massa.

Olha pra Adélia frustrado e se dá conta que informação agora, só quando o Júnior chegar da escola, com o caderno da aula de OSPB.

segunda-feira, 3 de julho de 2017

Brilho eterno de uma mente sem lembrança.



Caso tivesse que definir o filme numa frase, diria que se trata da escolha entre  esquecer um amor para sempre e sofrer por um amor que não é mais correspondido. Se questionada fosse, há alguns anos sobre qual seria a minha escolha, diria sem pestanejar: esquecer. Hoje, ciente de que somos o resultado das experiências vividas, escolheria o sofrer.

Houve um tempo, lá na minha adolescência, que tive muita vontade de apagar um certo moço da minha vida. Na época, dentro da minha ingenuidade, pensava: “Ah, como eu queria uma maquininha que abrisse minha cabeça e tirasse o fulano de dentro...”

Quando assisti “Brilho Eterno”, me lembrei imediatamente daquele desejo que me acompanhou por alguns meses. No filme, Joel e Clementine, personagens vividos por Jim Carrey e Kate Winslet, formam um casal apaixonado que não consegue se relacionar de forma tranquila. Diante do fracasso da relação, Clementine decide se submeter a um tratamento experimental para esquecer definitivamente Joel, que quando descobre o feito da amada, por vingança, resolve fazer o mesmo. No meio do processo, no entanto,  ele se arrepende e começa uma jornada para levar Clementine aos “lugares” de sua mente aonde ela não possa ser apagada.

Diferente de Clementine e Joe, o par da minha história e eu, não tínhamos problemas no relacionamento. Era ótimo, mas ele nutria uma necessidade de estar com muitas meninas ao mesmo tempo e isso não fazia parte do meu sonho, claro. Também nos tornamos facilmente estranhos. Não houve o cuidado de guardar na memória. 

Brilho Eterno” flerta com o bizarro para surpreender o espectador.  O título do filme - lançado em 2004 - foi inspirado no poema “DE ELOISA PARA ABELARDO” de Alexander Pope (Inglaterra,1688 – 1744). O diretor é Michel Gondry mas a grande estrela é o roteirista Charlie Kaufman (de “Quero Ser John Malkovich”) que ganhou o Oscar de roteiro original pelo trabalho.
 
O filme faz uma crítica ao comportamento prepotente que tenta, invariavelmente, recriar a memória ruim para evitar a dor, sem entender que assim como o amor, a dor também nos define.
Mas, muito além de uma história inusitada, sobre um tratamento alternativo e estranho, muito mais do que a tentativa de criticar o comportamento humano, trata-se, na minha opinião, de uma grande história de amor. Mesmo que pareçam incompatíveis, Joel e Clementine vivenciam um amor intenso, verdadeiro – aquele tipo que apesar de todo o esforço, não conseguimos apagar de nossas lembranças. Isso fica claro no decorrer do filme.

Num dado momento do filme, a personagem de Kirsten Dunst, declama parte do poema de Pope:

“Feliz é a inocente vestal / Esquecendo-se do mundo e sendo por ele esquecida / Brilho eterno de uma mente sem lembranças / Toda prece é ouvida, toda graça se alcança”.

O poema sugere que a única maneira de ser feliz é esquecendo e tornando-se esquecido e que a graça só existe na ausência da lembrança. O autor fala sobre mentes imaculadas e corações resguardados, que teoricamente não são assombrados por lembranças daquilo que fomos um dia e que miseravelmente, nunca mais voltaremos a ser.

O fato, é que não temos como “abafar os ecos de relações ou circunstâncias” que um dia vivemos. Nos esforçamos para esquecer, mas basta um cheiro, um lugar, uma música e somos transportados aquele momento de paixão que quase fez nosso coração parar.

O que seríamos hoje, caso não tivéssemos vivido experiências tão importantes, mesmo que tenham significado noites em claro, dor no peito, lágrimas infinitas? Abrir mão dessas lembranças, seria correr risco de abrir mão de muito do que somos.

Diante disso, concluo que o “Brilho” que se perpetua nesta mente sem lembranças é Clementine para Joel e Joel para Clementine.

Das curiosidades: Há teorias de que cada cor dos cabelos de Clementine foi usada para expressar um estado de espírito diferente. O azul representaria ora a harmonia de Clementine com seus próprios sentimentos e com a relação estabelecida com Joel, ora a frieza da personagem. O verde, seria a esperança depositada no começo do relacionamento, o laranja nos momentos de crise e o vermelho como o ápice do amor entre os dois personagens.

sexta-feira, 30 de dezembro de 2016

Vida é estranha, ou 2016 - entre a Dengue e a Amigdalite.




Esse ano começou estranho. Antes até; durante os planos para uma festa de réveillon, a coisa já foi ficando sinistra e só não passei a meia noite sozinha, porque meus filhos, talvez por culpa, resolveram ficar por aqui. E aí, foram chegando uns amigos deles e virou uma pequena farra.

Acordei no dia primeiro – acordei rsrsrs, como se tivesse dormido – péssima. O humor era de dog chupando manga, o corpo doía, a cabeça também. Não demorou muito para o diagnóstico: dengue. Cama, dor, solidão absurda. O boy se mandou... ele diz que fui, eu acho que foi ele, enfim....

Quando a coisa começou a melhorar, lá pelo meio de Janeiro, a notícia de um grave problema de saúde de uma prima muito amada, me tirou de novo do eixo.

Um pequeno hiato de paz no Carnaval, com as queridas Lulus, mas até isso foi estranho. Rolou divergência e estranhamento que nunca havia surgido. Devidamente superados, fato, mas ainda assim, estranho demais.

Final de março, piora da minha prima e fui para Salvador com coração partido, mas cheia de esperança por dias melhores. Felizmente, depois de muita luta, ela está muito bem.

Em Abril recebi a visita de um amigo querido e outro oásis se fez. O "boy" deu o ar da graça de novo. Ele vai ficar puto de ser chamado de boy, mas...
- Liga não, viu? Você é meu menino lindo! 

Em Maio uma das minhas maiores alegrias do ano: Show da minha amada Simone. (É gente, eu amo. Até o lado B dos discos, o “Então é Natal” e qualquer coisa que ela cante). Em seguida, o aninho desgraçado, mas em seguida mesmo, tipo dia seguinte, tive uma briga horrorosa com namorado e ficamos afastados por meses.

Junho teve Simone de novo.... oh alento!!!!!!!

Em julho, cheguei ao fundo do poço mas achei uma molinha chamada Luz da Serra e desde então, emergi das profundezas. Gratidão define descobrir minha capacidade de superação (palavrinha chata, né?) e de aprendizado.

Uma tristeza em agosto acabou por trazer meu bem - o boy -  de volta e as coisas tem sido melhores a cada dia.

Setembro só não passou batido –depois de um agosto com 243 dias  - porque tivemos a revelação do maior escândalo político aqui do Fazendão. Não ficou pedra sobre pedra e a partir daí, as coisas ficaram animadas, viu?! Cada tombo um flash.

E a vida foi seguindo, às vezes rápido demais, às vezes numa lerdeza de dar até certa aflição.

Um oásis em novembro trouxe o Gu e a Élida. Mas - ano siniiisssstruuuu - o mês também correu entre prisões e habeas corpus,  me deixando com olhos fixos na timeline do Face e nos Jornais matinais da cidade. 

By the way, 2016 morreu gente famosa pacas, né? Mas todo ano morre, então, sei lá! Se eu for pesar mesmo o que acho um desperdício, citaria Domingos bonitão da Globo,  George Michael e a tal da princesa Léa, maybe! A maioria beirava ou ultrapassava os 80 e aí não podemos achar uma tragédia. Só acho!

Tragédias mesmo aconteceram pelo mundo. Tragédias aéreas, tragédias com pessoas conhecidas.... tragédias!!!! Sim, elas também acontecem todos os anos, mas sei lá, esse foi um capricho só, né?

Finalmente chegou dezembro. Com ele, dias de muito trabalho – amém – de cansaço absurdo, de algumas tristezas, decepções e uma inesperada amigdalite. Pode???  Mas a gratidão de ver tudo sendo superado de forma rápida e sem mimimi,  também esteve presente.

Não espero nada de 2017. Nada!!!! Aprendi, com aquele amigo que me visitou em abril, a não criar expectativas e ficar atenta às oportunidades. E assim será.

Não espero nada pra mim, mas desejo “procê que me lê”, um ano de prosperidade.


Beijo!

terça-feira, 7 de junho de 2016

Festa Estranha!



Era um dia frio de julho. Apesar do habitual calor da cidade, mesmo em tempos de inverno, aquela noite estava especialmente gelada.

Havia se questionado na frente do espelho, enquanto se maquiava, se devia mesmo ir à tal festa. Sabia não ter nenhuma afinidade com aquela gente, mas não queria decepcionar o parceiro, o  convidado de fato.

O par foi pontual, coisa rara. Ela entrou no carro ainda relutante, e ele percebeu:

- Não quer ir?
- Na verdade, não. Mas me comprometi com você e não vou voltar atrás.

Foram em silêncio até o local. Por algum motivo que não se explica, tinha uma vaga na porta e ela imaginou quem teria ido embora tão cedo.

- Deve estar animadíssimo aí dentro, pensou de forma irônica.

A casa ficava no alto e para chegar até a porta principal, tinham que subir cerca de 15 degraus. Lígia subiu o primeiro lance, focada na escada, até que ouviu a voz ligeiramente estridente e um tanto anasalada:

- Ahhhhh!!!!!! Até que enfim... Bem vindos a minha casa!!!!!!!!

Levantou os olhos e deparou-se com uma linda mulher no topo da escada. Saltos altos, vestindo longo estampado, justérrimo, costas de fora, sem mangas, em tons dourados. Cabelos presos displicentemente de propósito e um ornamento carnavalesco amarelo ouro com pedras vermelhas, caído na testa. De propósito, mas nem tão displicente assim.

Cumprimentaram a anfitriã e foram conduzidos à mesa na área externa da casa. Tudo muito bem decorado com tapetes persas importados, louças coloridas, velas, plantas, sedas. No melhor estilo oriental.

Comida típica farta, servida por garçons impecáveis. Bebida de qualidade, à vontade.

Sentada num canto sem muita visibilidade, Lígia agradeceu poder ver sem ser vista e admitiu, estava se divertindo com as cenas. 

Mulheres vestidas como se estivessem numa festa no reino de Senegal - incluindo o calor. Muito peito e muita perna de fora. Sandálias altíssimas, muita pedraria, muita maquiagem, muito botox, muito perfume, muita inadequação à temperatura glacial da noite.

Um certo doutor resolveu dar uma palhinha cantando bela música com sua voz nem tão bela assim. A moça tímida - obrigada pelo pai orgulhoso-  cantou um trecho de ópera e todos pareceram estar com alguma vergonha alheia. Músicos se revezaram no violão. 
O ápice da noite foi a bailarina em trajes de odalisca - bem sumários, por sinal - rebolando ao som de um tambor muito bem tocado.

Foram todos intimados a descer até o local da apresentação.

Sentada nos degraus de uma escada - apenas os convidados mais habitués ocupavam sofás e poltronas como tronos, aliás! - lembrou-se de uma cena do filme "O Bebê de Rosemary" onde todos os presentes, menos a pobre Mia Farrow, faziam parte de uma confraria que adorava o demônio.
Só não se sentiu a própria Rosemary, porque conhecia as histórias absurdas atribuídas ao grupo. De resto, o que se passava ali , não era muito diferente. Nem a adoração a seres nefastos podia ser desconsiderada.


No final da noite, exausta, mas bem alimentada - foi preciso admitir - Lígia seguiu em silêncio para casa, pensando como tinha sorte em ser apenas coadjuvante, naquele espetáculo. 
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