Sobre o Conteúdo do Blog

Blog de histórias reais e de ficção.
Um lugar para expor opiniões que provoquem dor ou delícia!
Qualquer semelhança com histórias ou comportamentos reais poderá ter sido mera coincidência. Ou não!



terça-feira, 31 de julho de 2012

Uma tia chamada Chafia!





Sei que quando nos conhecemos eu tinha pouco mais de um ano. Claro que não me lembro desse momento, mas impossível não esquecer muitos outros que compartilhamos ao longo de quase quarenta anos.
Não sei exatamente quando ela se foi, pra mim parece uma eternidade. Sinto saudade dela sempre e me emociono quando me lembro da sua voz doce e seu sorriso lindo.
Tia Chafia foi nossa vizinha por 13 anos e continuou a fazer parte da nossa vida pra sempre. Casada com Tio Aviro, que partiu bem cedo, era a mãe do Alberto, da Cristina, do José e do Paulo. Ah era a dona da cadela chamada Cacilda, presente em outras histórias minhas.
Era nosso anjo da guarda. Sempre prestativa sempre carinhosa. Cozinheira de mão cheia - o cheiro dos seus quitutes é forte em minha memória e ainda me deixa a boca cheia d’água.
Nossas casas eram geminadas e no quintal tínhamos uma janelinha, sempre aberta, que facilitava nosso contato. Era só aparecer ali, chamar por ela e pronto, tudo resolvido – fosse o que fosse.
Quando tinha seis anos tive hepatite.  Era carnaval e fiquei quarenta dias de cama. Um dia senti o cheiro dos biscoitos dela e não tive dúvida, levantei, sentei na janela do quarto – um sobrado – e chamei por ela. A coitada se apavorou com a possibilidade da queda e tentando aparentar uma calma dizia:
- Desce daí Ane (eles me chamavam assim), a tia leva os biscoitos pra você!!
Éramos uma só família não me lembro de precisar tocar a campainha da casa dela.
Ela esteve em momentos importantes da minha vida. Estava lá quando me casei e quando minha filha nasceu fez questão e nos visitar.
Aqui comigo, além das lembranças, tenho algumas fotos, um coração de malaquita bruta que ela me trouxe da África e um ovo da mesma pedra lapidada que também trouxe de lá, mas que ficava na casa dela junto de mais dois. Numa das vezes que fui visita-la elogiei a peça e sem pestanejar me deu.
Foi ela que fez a primeira mantinha de tricô da minha filha Marcella que guardo até hoje. Era um talento nessa arte manual. Fazia coisas lindas e era incrivelmente rápida. Todo mundo em casa tinha uma malha, um pulôver, um gorro, um cachecol que fosse, feito por ela.
Ela nasceu num dia 31 de Julho de um ano distante. Morreu velhinha e me deixou profundamente triste com sua ausência. Até hoje, quando penso na impossibilidade de vê-la não consigo deixar de chorar.
- Tia, onde estiver, saiba que a amo muito e sinto constantemente a sua falta.
Comigo além das pedras, do tricô, das fotos e das lembranças, ficou a certeza do amor incondicional que ela sentia por mim.

domingo, 24 de junho de 2012

Os Carimbos


Magy era uma mulher linda, forte. Empresária de sucesso. A descendência sueca dava a ela um ar enigmático. O sotaque apesar de charmoso intimidava.

Caminhava pelos corredores da agência de propaganda paulista de forma austera e confiante. Nas paredes obras do seu acervo pessoal que a enchia de orgulho. A maior parte dos quadros pintados por ela mesma. Era um grande talento, diga-se de passagem.

Nós pobres mortais, que trabalhávamos na área de mídia, só ouvíamos a voz dela ao longe. Não nos dirigia palavra.
Adorava palavrões. Falava alto, sem pudor.
Mandava e desmandava no departamento de criação e sob sua tutela tinha profissionais altamente gabaritados. Todos a temiam!

A agência atendia contas importantes, tínhamos trabalho o tempo todo. O departamento de mídia, normalmente um termômetro autorizava tamanha quantidade de comerciais, anúncios e spots que, certamente a temperatura na criação devia estar bem alta, até porque, ela fazia questão de pré aprovar todas as artes antes de encaminhar aos clientes. Sua palavra era lei. Cliente pouco discordava de suas recomendações.

Diante da demanda, havia necessidade que ser ágil na execução e na aprovação dos layouts e Maggy mandou fazer dois carimbos. A história rapidamente se espalhou pelos quatro cantos da agência.

- Você viu? O comentário vinha sussurado – A Magy mandou fazer carimbos para aprovar os lay outs e os planejamentos. Se a moda pegar vai servir como ok até nas autorizações de mídia.
Na criação, o primeiro anúncio que voltou da sala dela provocou gargalhadas e dúvidas:

                                                                     
Sim, um carimbo com essas palavras estampado nas costas do papel “carmem”. Era uma época onde o arte finalista tinha mesmo que desenhar, usar guache, nankin, aerógrafo, tudo devidamente montado em papel carmem (preto)  “pas partout” e coberto com o papel manteiga . Imprescindível cobrir a arte, senão o risco de chegar no dia seguinte e ter virado comida de barata era imenso!!!

Sem entender o diretor de arte foi à sala dela:

-Magy, não entendi. Você gostou do anúncio?

- Não PORRA, se tivesse gostado teria carimbado


                                                                     

quinta-feira, 14 de junho de 2012

Quando um certo alguém.




Década de 90 e eu trabalhando como gerente comercial de um grupo de emissoras de rádio de Ribeirão. Era o ó! Faturamento baixíssimo, em consequência de uma programação inconsistente, que dava pouca audiência. Sugeri que passássemos a apoiar espetáculos teatrais e shows. Teríamos nossa marca em outras mídias e poderíamos melhorar a venda dos espaços.

Deu muito trabalho, mas foi muito divertido. Divertido e melhor, deu resultado! Faturamento subiu 200%.

Fechamos esse show, entre 94 e 95. O empresário que veio acertar a parceria era um chato e a produtora que chegou dois dias antes do artista, fazia a linha “chato sobe nela e desce se coçando”.

O primeiro “piti” da mala, foi na reunião com o Buffet que, diga-se de passagem, foi um custo conseguir.

 - Ele querrrr comida árabe. Kibissss, Isssfîirrassss, tabule, babaganuche. Tudo em piquenasss porrrções.

Além daquele sotaque carioca dos mais enjoados, ela mostrava com as mãos o tamanho das malditas "pequenas porções". A dona do Buffet declinou. Disse que não daria conta do serviço. Ou da chatice? Eterna dúvida.

Foi um perrengue conseguir um restaurante árabe que topasse fazer permuta com a emissora.
No dia do Show, o tal cantor chegou e se instalou no extinto Holiday Inn. Não trocou palavra com qualquer pessoa. Mal humorado, de óculos escuros e um bico que ocupava 70% da cara, seguiu pra Cava do Bosque para passar o som.
Nessa altura, o mobiliário do camarim já estava montado: Sofás azuis, tapete persa (exigência do tal), espelho enorme, arara para pendurar o figurino.
Eu mesma supervisionei a montagem para ter certeza de que tudo estava certo. Mal entrei em casa para almoçar, meu celular “PT950 Tijolo” tocou. Era a produtora:

- O camarim não issssstá bommmmm !!!
- Não? O que houve?
- Falta uma mesa grande, retangular, coberta com toalhiasssss brancaissssssss (ai sotaque maldito). Precisa ser inssstalada encossssstada na parede.
- Ok, vou pedir para providenciar. Agora, se for para colocar as comidas, o restaurante vai montar a estrutura num outro espaço....
- Náaaooo !! É que ele pricisa colocar seusssss bichinhusssss de pelúcia.
- ???? Não ousei comentar.

E lá fui eu, sem comer, pra Cava providenciar a montagem da tal mesa.
Depois de pronto, a produtora mala entrou com malas e sacolas e depositou sobre a mesa uma quantidade infinita de ursinhos, coelhos, cachorros, carrinhos, bonecas, canequinhas da Xuxa, escovinhas de dente, gatinhos, carrinhos matchbox, foguetes, trenzinhos....

Arrumou tudo com cuidado, olhou pra mim – até com certa doçura -  e justificou:

- Ele precisa disso pra se coincentrarrrr. Abraça todusssss, precisa ver! Dá enerrrgia, sabe????
- Ahã !!  - Imagine a minha cara.

Já estava de saída, quando ela entrou em pânico:

-MELDELS, missssssquici da Barrrrrrrrrbie. Ele vai me matar.....

E lá fomos nós, correndo em pleno sábado, já meio de tarde, em busca de uma Barbie para evitar um “piti” e quiçá o cancelamento do show. O homem era nervoso, bênhe!

A noite, fiquei na entrada dos camarins, na esperança (depois de tanto trabalho e perturbação) de ver de perto o artista em questão. Até hoje me pergunto por onde foi que ele entrou. Não vimos nada.
Enquanto rolava o show, entramos no camarim para ver se tudo estava de acordo. Ele ia comer depois da apresentação- checamos todo o cardápio, tudo perfeitamente acomodado em “piquenas porrrrçõiiiis”.
A mesa com os bichinhos estava desarrumada. Havia pelúcia no chão, no sofá, no tapete. Na arara três Hobbies de Chambre: um azul escuro, com estampas miúdas (acho que eram florzinhas) em vermelho, um branco atoalhado e um rosa pink de cetim. Simmm!!! E todos eles tinham uma pantufa combinando.
Dentro da Cava o cara interagia de forma íntima – pra não ser grosseira e dizer: Se esfregava - no palco com um dos músicos, especialmente convidado para a ocasião. O mesmo que, alguns meses depois, foi lançado na mídia cantando baladinha de verão romântica. A carreira não decolou.

Fim de show,  corremos de volta à porta do camarim. Ele saiu pelo mesmo lugar que entrou, ou seja: não faço a menor ideia de como.

- Possivelmente a bordo do foguetinho que habitava a mesa dos brinquedos, pensei!

Entramos: Nenhum bichinho, nenhum hobby.
Abandonadas, num canto já escuro, as malditas “pequenas porções” de comida árabe ainda com o filme transparente por cima, intactas!

Quando um certo alguém cruzou o teu caminho, tudo bem meu bem. Tudo sem força e direção!!
E no Brasil sol de norte a sul.

Se é que você me entende.

quinta-feira, 17 de maio de 2012

Donna Summer, Mac Arthur e uma saudade.




Quando soube que Donna Summer tinha morrido, senti saudade antes de sentir tristeza. Saudade de um oásis em meio ao caos que foi minha adolescência.

Era Janeiro de 79 e eu estava de férias em Pontal, hospedada  na casa da minha querida tia Neide. Vó Carolina ainda era viva e impunha, mesmo sem querer, sua presença. Sempre muito quieta, mas igualmente forte, passava a maior parte do tempo na sala de jantar onde ficava a vitrola. É, vitrola!

Ao lado dela - da vitrola, claro - durante todo o tempo em que lá estive, repousava a capa do LP duplo, Live And More, lançado pela Donna no ano anterior. Era ao som de Mac Arthur Park que eu acordava todos os dias.

Lembro-me de abrir os olhos nos primeiros acordes e sentir uma alegria imensa. Estava na cidade que eu tanto amava, cercada de pessoas que me tratavam com tanto carinho.
Não demorava pra minha tia entrar no quarto, avisando que o café estava servido. Sempre carinhosa, sentava-se a beira de uma das camas e queria saber o que tínhamos feito na noite anterior.

Meu dia começava bem. Muito bem para a uma menina, adolescente, que estava vivendo a felicidade inexplicável da conquista do primeiro amor. E o primeiro amor morava na casa da frente!

Pulava da cama, abria um pedacinho da janela e espiava. Como era fácil ser feliz: Uma janela entreaberta e uma possibilidade.

Não me lembro de ter vivido emoção assim. Não me lembro de ter amado com tanta ingenuidade, com tanta entrega, sem expectativa.
Nessa época o namorar era feito de beijos, abraços e mãos entrelaçadas. Não havia possibilidade de qualquer avanço. A delicadeza da lembrança talvez se deva exatamente a isso.

No meio do mês, como todos os anos, fomos para o Guarujá. Minha prima Rosana, eu, meus pais e irmãos. Foram 15 dolorosos dias, na praia, longe dele, da Donna e do Mac Arthur. Dias em que incansavelmente negociava com meu pai a volta à Pontal para passar os últimos dias de férias.

Sinto ainda forte emoção quando me lembro do dia que voltei. Era noite, o céu estrelado de forma inacreditável, Tio Luiz na calçada com o braço em volta da  tia Neide.
Meu olhar vagava entre o céu e a porta da casa do meu amor. De repente ela – a porta - se abriu e rapidamente, numa brincadeira, me esconderam. Posso vê-lo atravessando a rua, num passo desengonçado de menino que cresceu demais.

Que delícia lembrar a cara que ele fez quando me viu! O sorriso, que era lindo, se abriu e o olhar, que sempre foi penetrante, sorriu junto.

O desejado beijo não pode ser dado. Não naquele momento.

- Nãoo, não na frente dos tios!

Ah, como era bom estar apaixonada e ter esse amor correspondido, como é bom poder lembrar isso com tanto carinho.

Vivemos uma história linda, naqueles dias quentes de verão e céu exuberante. Simples, sem planos abstratos e com todos os sonhos concretos.

A vida não nos quis juntos. O amor não foi suficiente, ou talvez, simplesmente tivessem outros planos pra nós.

Cada um seguiu a sua maneira.
Fiz minha família, ele a dele.
Fiz carreira, ele desistiu.
Sou feliz, mas não posso afirmar o mesmo sobre ele.

Nunca mais nos falamos. Nunca mais!

Nunca mais nos vimos. Só a distância, há 5 anos!

Mas a verdade, é que isso não tem a menor importância. O que conta é a emoção que pude viver graças ao que vivemos. Emoção que ainda posso sentir quando e onde quiser.

Quando Donna morreu, uma parte dessa história se foi, mas pra minha sorte não levou nada com ela. Só deixou:


Uma música, uma lembrança e uma saudade.







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