Quando tudo aconteceu, assim
tão definitivo, não quis acreditar na veracidade dos fatos.
No dia um, negociei comigo
mesma uma forma de reverter a situação. Negociei com Deus, com os anjos, com os
espíritos, com os Orixás.
Sem crédito, no dia 02 insisti
em vão.
O terceiro dia nasceu lindo e
achei que minhas preces tinham sido atendidas. No dia quatro tudo se desfez.
No quinto, já sem aliança, sem
alma, sem sorriso, sem esperança, vesti calça e camisa e tentei seguir com a
vida. Passei a manhã entre lágrimas e falas desconexas, ouvida atenta e
carinhosamente por uma amiga querida.
No sexto me afastei de tudo e
de todos. Me tranquei, chorei em desespero
inenarrável.
Não me lembro mais dos dias
seguintes a esses. Apenas um topor e uma sombra verde estavam presentes junto
com os amigos. Tantos, tão queridos, tão solidários. Chorei muito de emoção.
Chorei de me saber tão importante pra tanta gente. Chorei com a solidariedade
que veio de lugares inimagináveis.
Agarrei-me à família que,
sempre amorosa e presente, esteve comigo todos os minutos.
No décimo terceiro festei, saí,
me diverti, conheci pessoas interessantes.
O dia seguinte foi lindo. Amigo
querido, abraço carinhoso, declaração de amor e cuidado eternos. Minha alma
ganhou brilho, meu olhar ganhou brilho, minhas mãos pararam de tremer com tanto
aconchego e amparo.
Lá pelo décimo quinto dia, como
que se eu não merecesse o descanso, Nagasaki e Hiroshima tomaram ares de bombinha
de São João, diante da notícia que recebi. O cogumelo que se formou me transformou numa pessoa distânte de mim
mesma. Desfigurada, horrível, irônica, sarcástica.
No décimo oitavo descobri que
soltaram a bomba em lugar errado.
Estouraram por impulso O estrago? Já estava feito e foi sábio. A fumaça que
vi indo embora era verde. Verde como a esperança que tive até então. Esperança
dissipada no horizonte abriu os caminhos.
No vigésimo terceiro dia,
esvaziei as gavetas que ainda tinham alguma sobra do que fomos nós dois.
Esvaziei armários, caixas. Esvaziei meu coração.
No vigésimo quarto decidi que
viveria só pra mim, só por mim. Cada um no seu quadrado. Cada um cuidando da
sua dor, cada um com sua escolha. Escolhi ser feliz de novo e rápido.
A partir daí, os dias foram se
iluminando, minha alma foi me reconhecendo, eu fui me enxergando de novo no
espelho. Os olhos voltaram ao normal, curiosos!
Passei a ver as possibilidades,
o futuro, as oportunidades.
No trigésimo dia, como se o
universo seguisse o calendário, em plena madrugada, assim do nada, senti uma
pequena revoada de borboletas no estômago. Ainda tímidas, desconhecidas,
despretensiosas, mas importantes o suficiente para me fazerem ver que é
possível.